Wednesday, February 12, 2020

Lágrimas

 Hoje eu quase chorei. Não sei se uma lágrima ou duas conta, mas me ensinaram a não chorar. Me ensinaram a ser "HOMEM", engolir a porra do choro e dos sentimentos esmagadores que já estão me engolindo. Se você chorar, você é mais um "viadinho" que o mundão fodido vai mastigar. Mas é foda não derrubar uma lágrima ou duas olhando para trás, mesmo sabendo que eu tenho que olhar para frente. Eu estava pensando hoje no segundo suicídio que eu presenciei: o primeiro foi um vizinho com esquizofrenia que pulou do vigésimo andar, em 1994. Eu tinha 7 anos na época, e me lembro do giroflex do IML e o corpo abstrato coberto por um lençol na maca. Só que o segundo suicídio foi foda. Saber que por detrás do crisântemo tinha um amigo enforcado no banheiro de casa, e ver ele no caixão com o pescoço todo fodido foi cruel. Mas se eu pensar nisso, eu choro, e eu nunca tive esse espaço. Meu pai me ensinou a dar socos e me masturbar para pornô barato com 8 anos. Ele nunca me deu colo, nunca me deu nenhum tipo de conselho, não me ensinou a jogar bola, não me ensinou a namorar. Ele só me ensinou que eu deveria foder uma mulher com força, assim como ele fazia com minha mãe quando ele chegava bêbado em casa, querendo estuprar e espancar ela ao mesmo tempo. Parecem ser duas histórias paralelas (e são!). Meu pai bêbado e meu amigo morto. Mas é que nunca poder chorar, nem quando eu mesmo fui estuprado, é dolorido. Os dois foram ingredientes para uma depressão fodida que eu carrego comigo desde a porra de 1995. Perdi as estribeiras, fiquei louco, fui internado 3 vezes em um manicômio, mas não chorei. Não chorei porque foi assim que me ensinaram, e deixar cair uma lágrima ou duas hoje me pareceu até sensato, mas sinônimo de fraqueza. Mas os anos se passaram, e eu não vivo mais sobre as regras de merda do fodido do meu pai. Hoje, talvez, eu possa me permitir deixar cair uma lágrima ou duas pelos lutos que eu nunca tive, pela vida cruel que eu levei, pelas culpas que eu carrego, e quero deixar escorrer pelas covas do meu rosto, e quem sabe, inundá-las com o prazer de ser livre para ser sensível e me perceber como um humano (todo ferrado, mas um humano), que merece deixar uma lágrima ou duas deslizarem, porque o passado foi foda, e ao olhar para trás, eu quero lavar tudo aquilo com uma lágrima ou duas mesmo, foda-se.

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